Categorias
Histórias

O veneno da serpente

Muitas histórias começam com o seguinte intróito: “Aconteceu com um amigo meu…” e esta passagem não é diferente.

Tenho um amigo que mora em uma chácara cercada por terreno pantanoso. Diziam os vizinhos que nas redondezas habitava uma peçonhenta serpente jararaca capaz de amedrontar os mais incautos. Contavam histórias a respeito deste terrível ofídio que era capaz de trazer pânico ao local. Destruía tudo o que estava ao seu redor, não se importando com inocentes criaturas que nada tinham a ver com o seu habitat. Na surdina da noite com o seu olhar penetrante e traiçoeiro, avançava sobre a criação do meu amigo e destruía tudo o que encontrava pela frente.

Isso aconteceu durante um bom espaço de tempo. Preocupado com as investidas cada vez mais constantes do inimigo, e sentindo-se impotente em dar cabo ao voraz animal, pos em prática uma estratégia para tentar por fim as investidas da jararaca.

Começou estudando os seus hábitos e anotou que é muito perigosa, mas geralmente foge assim que avistada. Possui desenhos que lhe proporcionam uma excelente camuflagem, sendo difícil a visualização do animal, mesmo para olhos experientes.

Aprendeu, também, que a jararaca possui uma substância que auxilia no tratamento da hipertensão. O princípio ativo do captopril foi pesquisado e aplicado no combate a esse mal, rendendo 5 bilhões de dólares à empresa farmacêutica que desenvolveu os estudos. Além do captopril vários outros medicamentos já foram produzidos a partir de toxinas de serpentes.

A partir dos dados catalogados, o meu amigo passou a ter outro sentimento a respeito da temível serpente. Ao invés de continuar com a idéia fixa de exterminá-la, começou a pensar quanto seria útil mantê-la viva para poder usufruir dos seus escassos dotes benéficos. Sabedor que a espécie subia às árvores para apanhar aves, ou para comer os seus ovos, preparou uma engenhosa armadilha para capturá-la. Não demorou muito e lá estava ela presa para a satisfação do meu amigo.

Por ser seguidor e respeitador das leis naturais, não a sacrificou. Pediu auxílio à entidade protetora dos animais para, ao mesmo tempo, protegê-la de inevitável linchamento por parte dos seus vizinhos, e mantê-la viva para que a entidade competente pudesse estudar o seu comportamento e, posteriormente, devolvê-la a um distante terreno pantanoso, onde não mais importunaria os seus vizinhos, permitindo que estes vivessem em paz com muita tranqüilidade.

Portanto, na improvável hipótese de você encontrar uma jararaca em seu caminho, não a extermine. Devolva-a ao seu habitat natural.